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sábado, 6 de agosto de 2011

Desabafo

Essa semana, recebi um e-mail revoltado de um amigo que está usando pseudônimo e, em solidariedade a ele, cidadão honesto, trabalhador e que paga seus impostos em dia, resolvi dar-lhe voz no blog. Vejam a lamentável situação pela qual o rapaz passou:

“Amigos,

Há menos de um mês atrás, meu cunhado, ao parar para almoçar num desses restaurantes na estrada, ao voltar para seu carro, teve o dissabor de encontrar o mesmo com o vidro da porta traseira esquerda estourada e a coluna da mesma porta entortada, muito provavelmente com o auxílio de um pé-de-cabra, a julgar pela aparência dos danos. Como ele se lembrou de ter visto um policial militar (reconheceu a profissão pela farda...) dentro do restaurante enquanto almoçava, voltou até o estabelecimento e pediu ajuda ao mesmo. O policial então disse ao meu cunhado que pelo fato da ocorrência se dar em uma rodovia federal, ele estava fora de sua jurisdição e portanto não poderia fazer nada. Quando eu soube disso, fiquei chateado por imaginar o desgosto dele, um cara honesto, que conseguiu o que tem hoje através do seu trabalho ao longo de vários anos...

Pois bem, no último domingo à tarde, eu parei meu carro ao lado da igreja e fui participar da minha missa semanal. Lá pela segunda leitura, um barulho chato de alarme me tirou a concentração pois eu não conseguia mais ouvir o texto sagrado. Pensei, "tá parecendo o alarme do meu carro... " Mas como eu só ouvi esse alarme uma vez, há um ano e meio atrás, quando a concessionária me entregou o veículo e como, no fundo no fundo, o ser humano é otimista e sempre acha que as coisas ruins não vão acontecer com ele, eu disse pra mim mesmo: "Ah! não deve ser não. Deve ser algum descuidado que esqueceu de desarmar o alarme antes de abrir o carro..." Nisso o alarme parou. Ouvi mais um parágrafo da Epístola e a porra do alarme chato recomeça. Pensei: "Vou lá ver... " – e o alarme parou de novo, dessa vez bem mais rápido – "...Ah! Mas o que é que eu vou poder fazer se for mesmo o meu carro? Quando a missa acabar eu descubro".
Quando a missa acabou eu já tinha até esquecido do alarme. Mas aí eu descobri que tinham mesmo tentado levar o carro. Encontrei um buraco na lataria da porta, junto da fechadura. Fiquei feliz por um lado porque o maldito, filho-da-puta, desgraçado, morfético do ladrão não conseguiu levar o carro e isso por si só já foi um pequeno castigo pra essa criatura amaldiçoada, afinal ele não levou o meu e por causa do alarde todo, não deve ter conseguido levar o de mais ninguém. Pelo menos assim espero... Por outro lado, fiquei levemente emputecido, afinal de contas, eu não roubo, não mato, não como a mulher do próximo, não exerço cargo político em nenhum dos três poderes, enfim não faço nada de ilegal ou imoral que pudesse justificar tal sorte.
Entrei no carro e saí correndo, afinal vai que o ladrão resolveu me esperar pra levar o carro na marra, né? Fui direto para um posto da PM perto de casa (e longe do local da ocorrência). Chegando lá, disse ao soldado que gostaria de fazer um boletim de ocorrência de tentativa de furto. Ele me orientou a procurar uma delegacia da Polícia Civil, pois a militar só fazia B.O. de acidente de trânsito sem vítima. Eu disse que tudo bem, procuraria a delegacia então, mas questionei se não havia nenhum outro procedimento a fazer, afinal eu queria registrar a queixa no sentido de ajudar a polícia a identificar onde existem bandidos atuando pra ela poder saber onde reforçar o policiamento. Sabem qual foi a resposta? "A GENTE NÃO PODE FAZER NADA!"
Meus amigos, ouvi isso e todo o meu repertório de palavrões e impropérios me veio à mente mas, claro que fiquei mudo. Olhei em cima da mesa, atrás do soldado, e vi um fuzil jazendo em cima dela. Lembrei-me de quando era aluno da FATEC, numa manifestação que os alunos fizeram apoiando a greve dos professores (por melhores salários) e aproveitando pra pedir para que o governo do Estado melhorasse as condições da faculdade (a gente pleiteava na época coisas supérfluas como livros novos pra biblioteca, computadores pros laboratórios de informática, papel higiênico e sabonete pros banheiros...) e essa mesma "polícia" acabou carinhosamente com a manifestação disparando balas de borracha, bombas de efeito moral e de gás lacrimogênio contra os estudantes, terminando com as tradicionais massagens capilares com cacetetes. Aí sim eu fiquei totalmente emputecido!!!
A que conclusão que eu posso chegar a não ser a seguinte: qualquer trabalhador honesto, que consiga comprar aquilo que precisa com o dinheiro ganho honestamente, com o suor do rosto, não pode sequer reivindicar um salário melhor, que vem a PM e senta-lhe a porrada! Estudante, então, não tem nem o direito de ser acometido de uma caganeira na faculdade... E os que não são, correm o risco de ser infectados com os Enterococcus faecalis dos que são... Vai reclamar? Toma-lhe porrada! Aí esse povo precisa da polícia, forte, armada, valente, pra defender-lhe daqueles que não estão nem aí pras leis, e o que eles encontram? "A gente não pode fazer nada!" 
Peço desculpas por tomar o tempo de vocês, mas eu precisava desabafar isso e, mais ainda, lançar duas perguntas pra nós refletirmos:

1) Qual o papel do poder público na manutenção da segurança do cidadão honesto, que trabalha e paga seus impostos?

2) E, uma vez que não temos o Estado para nos defender, o que podemos fazer para cuidarmos de nossa própria segurança?

E quando eu digo "podemos" pergunto no sentido de "o que temos capacidade" e também "o que nos é lícito", afinal "podemos" nos armar até os dentes (e, claro, fazer uso dessas armas...) como fazem cidadãos de outros países mas, por força da lei, "não podemos" fazer isso, pois se assim agíssemos, nós nos transformaríamos nos transgressores. E muito provavelmente, para nós, haveria punição.
Amigos, pra terminar, só quero dizer que depois de tudo isso, chegando em casa ainda tentei o COPOM no telefone 190 e também não consegui registrar o fato. No site da Polícia Civil dá pra fazer B.O. de furto consumado, tentativa não! Na delegacia eu só vou se o conserto da porta ficar além dos mil reais e eu tiver que usar meu seguro. A última vez que precisei da polícia civil, perdi um dia inteirinho esperando a boa vontade do escrivão pra redigir e depois, do delegado pra assinar... Por isso, deixo mais um alerta. Se virem aquelas propagandas por aí que o governo faz dizendo que a criminalidade no Estado de São Paulo diminuiu, cuidado! Se essa estatística for baseada na quantidade de Boletins de Ocorrência, desconfiem!!! Afinal, todos fazem de tudo pra você desistir de registrar a queixa (os soldados, antes de eu sair do posto policial, ainda argumentaram sobre a inutilidade de fazer o boletim de ocorrência também na delegacia de polícia, já que eu não poderia descrever os "elementos"...)

Um grande abraço a todos!

João Crisóstomo

PS. Seguem dois links. O primeiro com a reportagem do caso da FATEC em 2004 e o segundo com sugestões de dispositivos anti-furto para automóveis. Recomendo o segundo modelo apresentado no video ( # CO -4U).


Bando de folgados, preguiçosos, indolentes! Não podem fazer nada, porque não querem fazer nada. Não há justificativa plausível para tamanha falta de humanidade.

Um comentário:

  1. Rafa... percebe-se que há um largo espaço entre os verbos querer e fazer, nesse contexto. Entre esses, temos a vontade de fazer e a falta dela. Infelizmente, a segunda prevalece. Pois aqueles que se enquadram na primeira são sempre mortos.Enfim, e o que sobram são os dotados de indolência que estão ai dirigindo o carro de Leis e etc que conduzem o Pais... O que fazer? A quem recorrer... Não poderia de deixar aqui trecho de um protesto poético (à minha maneira), cujo título é PORNOGRAFIA BRASIL... pois tudo isso é pornográfico, no sentido da extrema vergonha:
    "(...)
    E aí sangue frio, aqui também é Brasil!
    E tu não vens ao seio da Pátria?
    Somos gauche de garbo astuto ardil
    E te esqueces dessa margem plácida?

    Já pedi escolta às borboletas azuis
    Defesa ao Único Supremo
    Tenho sede de guerra sem fuzis
    E sangue derramado é o que temo!"

    Raquel

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